A empresa pode coletar informações sobre o estado de saúde, seja de visitantes ou colaboradores, objetivando verificar se estão com Coronavírus?

Considerando as medidas de emergência tomadas pelo Governo Federal no combate do COVID-19 (Coronavírus), em especial a edição da Portaria nº 188/2020 do Ministério da Saúde e a promulgação da Lei 13.979/20, as empresas deves redobrar o cuidado e tomar medidas em diversos aspectos relacionados a saúde de seus funcionários e terceiros. 

Pensando nisso o Alqualo e Gonzaga Jr. Advogados criou esse modesto texto com o objetivo de elucidar e orientar as empresas sobre a possibilidade de coletar informações sobre a saúde (tratamento de dados sensíveis) dos seus funcionários ou terceiros, bem como dos limites para tanto, nesse momento de pandemia causada pelo Coronavirus. 

De início destaca-se que não é recomendável a coleta em larga escala e compulsória de dados pessoais nesse sentido, sob pena de violação dos direitos fundamentais de liberdade e de privacidade, contrariando a Constituição Federal e a própria Lei Geral de Proteção de Dados (lei n. 13.709/18).  

Constituição Federal: 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[…]
III – a dignidade da pessoa humana;

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[…]
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Lei Geral de Proteção de Dados:

Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos:

I – o respeito à privacidade;

[…]

IV – a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem;

Todavia, a despeito da classificação do COVID-19 como pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS), aliado as legislações acima destacadas, entendemos pela possibilidade da coleta de dados sobre o estado de saúde de visitantes e colaboradores que possam estar infectados, desde que com a finalidade específica de verificar de proteger o estado de saúde geral, ou quando o o próprio titular dos dados assim autorizar.  

Isso porque, a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/18) trouxe a possibilidade de tratamento de dados sensíveis, o que inclui a coleta de dados referente a saúde do titular, quando houver consentimento específico deste ou imprescindível para a proteção da sua vida, ou incolumidade física, ou de terceiro. Confira-se: 

Art. 11. O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer nas seguintes hipóteses:

I – quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas;

II – sem fornecimento de consentimento do titular, nas hipóteses em que for indispensável para:

[…]

e) proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro;

Ademais, por força de lei o cidadão tem o dever de informar às Autoridades Competentes caso tenha comprovação, ou mera presunção, sobre pessoas que portem doenças enquadradas pelo Ministério da Saúde como de notificação obrigatória ou que exijam quarentena como medida preventiva. 

É nesse sentido o texto da Lei Federal n. 6.259 de 30 de outubro de 1975: 

Art. 7º São de notificação compulsória às autoridades sanitárias os casos suspeitos ou confirmados:

I – de doenças que podem implicar medidas de isolamento ou quarentena, de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional.

II – de doenças constantes de relação elaborada pelo Ministério da Saúde, para cada Unidade da Federação, a ser atualizada periodicamente.

§1º Na relação de doenças de que trata o inciso II deste artigo será incluído item para casos de “agravo inusitado à saúde”.

§2º O Ministério da Saúde poderá exigir dos Serviços de Saúde a notificação negativa da ocorrência de doenças constantes da relação de que tratam os itens I e II deste artigo.

Art. 8º É dever de todo cidadão comunicar à autoridade sanitária local a ocorrência de fato, comprovado ou presumível, de caso de doença transmissível, sendo obrigatória a médicos e outros profissionais de saúde no exercício da profissão, bem como aos responsáveis por organizações e estabelecimentos públicos e particulares de saúde e ensino a notificação de casos suspeitos ou confirmados das doenças relacionadas em conformidade com o artigo 7º.

De igual modo, preceitua a recente Lei 13.979 de 6 fevereiro de 2020 criada exclusivamente em decorrência da pandemia da COVID-19, vejamos: 

Art. 5º Toda pessoa colaborará com as autoridades sanitárias na comunicação imediata de:

I – possíveis contatos com agentes infecciosos do coronavírus;

II – circulação em áreas consideradas como regiões de contaminação pelo coronavírus.

Art. 6º É obrigatório o compartilhamento entre órgãos e entidades da administração pública federal, estadual, distrital e municipal de dados essenciais à identificação de pessoas infectadas ou com suspeita de infecção pelo coronavírus, com a finalidade exclusiva de evitar a sua propagação.

§1º A obrigação a que se refere o caput deste artigo estende-se às pessoas jurídicas de direito privado quando os dados forem solicitados por autoridade sanitária.

Ressalta-se, por fim, que a despeito da importância em manter o ambiente seguro dentro da empresa, recomenda-se total cautela na abordagem das pessoal sobre eventual contaminação, em respeito aos princípios da finalidade, adequação, necessidade e ausência de discriminação prevista na Lei Geral de Proteção de Dados.