Através da Lei nº 13.709/18 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), foi instituída a regulamentação das atividades de tratamento de dados pessoais, cuja finalidade principal visa a proteção dos direitos fundamentais de liberdade e privacidade, além do livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Isso significa que sua abrangência se limita exclusivamente ao controle e tratamento dos dados pessoais relativos a pessoas naturais dotadas de personalidade, isto é, pessoas vivas.
Assim, muito embora a LGPD tenha disposto expressamente sobre inúmeras matérias pertinentes ao tratamento de dados pessoais, tais como, aqueles realizados pelo Poder Público (art. 23) ou, ainda, nos casos de tratamento de dados da criança e do adolescente (art. 14), por exemplo, torna-se importante destacar sua omissão quanto à proteção dos dados pessoais de pessoas falecidas.
Isto porque, inexiste qualquer menção dentre os sessenta e cinco dispositivos constantes na extensa LGPD, sobre a possibilidade de proteção dos dados pessoais de pessoas já falecidas, tampouco previsão de como se daria sua forma de tratamento, o que, certamente, acaba por permitir aos estudiosos da lei a tomada de posicionamentos antagônicos dotados de insegurança jurídica.
O ordenamento jurídico brasileiro é silente, portanto, no que se refere à proteção e tratamento dos dados pessoais das pessoas já falecidas, diferentemente do que ocorre na União Europeia, por exemplo, cujo Regulamento Geral de Proteção de Dados (GPDR) nº 2016/679, em seu item nº 27, isentou-se da responsabilidade de regulamentar sobre o tratamento de dados pessoais dos falecidos, transmitindo para cada Estado-membro o encargo de legislar de forma autônoma sobre o tema.
Por sua vez, ainda que a personalidade da pessoa natural seja extinta com a ocorrência da morte, conforme determina o art. 6º do Código Civil, fato é, que os direitos da personalidade do falecido continuam resguardados, passíveis de proteção no mundo das relações jurídicas.
A LGPD não é, portanto, o dispositivo normativo capaz de assegurar a proteção aos dados pessoais do falecido, entretanto, plenamente cabível a aplicação do art. 12 §único do Código Civil, nos casos de exposição e/ou violação aos seus direitos de personalidade, cujos herdeiros e familiares possuem legitimidade para exigir e reclamar em juízo.
Por tratar exclusivamente da violação aos direitos de personalidade, obviamente o art. 12, §único do Código Civil, não será suficiente para garantir uma proteção integral ao tratamento dos dados pessoais do falecido, todavia, havendo a exposição de quaisquer dados que ofendam diretamente sua personalidade, honra, imagem ou memória, por exemplo, será cabível a postulação por parte dos herdeiros.
No entanto, ainda existem ressalvas acerca do tema, eis que no julgamento do Habeas Corpus nº 86.076/MT, o Superior Tribunal de Justiça entendeu de forma contrária e admitiu inexistir o direito ao sigilo e privacidade da pessoa falecida, no caso de obtenção de prova através do seu celular sem autorização judicial (STJ, RHC nº 86.076/MT, 6ª T., Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 19.10.2017, Dje 12.12.2017, Informativo nº 617).
Por fim, ainda que inexista disposição específica sobre o assunto, é importante que todo agente responsável pelo tratamento de dados pessoais mantenha o zelo e respeito por aqueles que versem também sobre as pessoas falecidas, mormente porque, havendo um dano causado pela sua exposição, há a possibilidade de seus herdeiros valerem-se do ajuizamento de ação indenizatória.
E você, o que pensa sobre o assunto? Acredita que a pessoa falecida é titular do direito à proteção dos seus dados pessoais ou ele se extingue com a sua morte?
Por Cinthia Couto